domingo, 14 de abril de 2013

RITMO DE QUIXADÁ: DJ leva funk do CE para a Europa


Aos poucos, o ritmo vem ganhando mais adeptos mesmo em uma região dominada há anos pelo autêntico forró.

Quixadá O Disc Jockey Everardo Domingos da Silva, conhecido no mundo artístico como DJ Jacaré, estará em breve se apresentando em uma casa de shows de Amsterdã, na Holanda. A participação dele na Europa não seria nenhuma novidade como a de tantos brasileiros mostrando seus talentos no Exterior, não fosse um detalhe: ele conquistou espaço tocando funk nos bailes do Interior do Estado do Ceará, onde a preferência maciça é pelo forró, um gênero genuinamente nordestino.

Foi tocando nas noites das cidades do Interior que o DJ Jacaré se destacou. Agora, ele apronta as malas para se apresentar em Amsterdã, na Holanda FOTO: ALEX PIMENTEL


A façanha do DJ começa a ganhar destaque nas redes sociais. Muitos internautas ficam admirados. O show dele está agendado para o dia 11 de maio, no Club Panamá, com capacidade para mais de 10 mil pessoas.

Apesar da modéstia DJ Jacaré, confessa ser o primeiro cearense a se apresentar numa casa de espetáculos da Europa com o electro-funk, um estilo musical brasileiro cuja origem vem das favelas do Rio de Janeiro.

Zezé Di Camargo

Ele disse ainda haver necessidade de seus empresários, quem o representam na Europa, DJ Kbca e Nerynho confirmarem, mas ele deverá dividir o palco com uma das maiores duplas sertanejas do Brasil, Zezé Di Camargo e Luciano em Bruxelas.

A festa terá como público brasileiros erradicados na Holanda e países vizinhos. Mas muitos europeus, principalmente holandeses e alemães, apaixonados pela descontração e alegria dos nossos compatriotas também estarão presentes.

Para DJ Jacaré será a oportunidade para expandir os horizontes da musicalidade excluída dos grandes eixos culturais. Fazer escalas nos grandes centros é o sonho de todo artista. Partir de Quixadá e conquistar a Europa é muito mais. "É uma prova de que o impossível pode se tornar possível", conta.

O motivo especial da comemoração está no reconhecimento do seu talento. Foi encontrado por empresários brasileiros quem moram na Europa através da internet.

Ele agradece a Bom Brasil e Events BR pela oportunidade. Quem sabe o ritmo funk cearense agrade e desponte uma turnê pela Europa? O primeiro passo está sendo dado. As malas estão prontas. Mas para conseguir projeção não foi fácil. DJ Jacaré confessa sua paixão pelas festas de dancing. Viu nelas uma oportunidade profissional, mas no início houve resistência e preconceito dos pais. Discotecário não era profissão. Era início dos anos 90, ainda morava em Fortaleza e a paixão pelos estúdios era maior do que a reclamação deles.

Quando começou a se envolver com a música as baladas eram consideradas coisa para quem não tinha ocupação. Mesmo assim matava aula na escola para acompanhar o programa de Silvio de Paula na rádio. Foi incentivado por ele a fazer um curso. Dedicou-se, conquistou amigos e espaço.

Sua trajetória profissional começou quando tinha 14 anos, incentivado por Paulinho Leme, na época disc jokei. Com 17 anos, decidiu se profissionalizar, queria trabalhar com comunicação, entretenimento, fazer as pessoas se divertirem através da dança. Seu professor foi o DJ Silvio de Paula. Não demorou para integrar uma equipe de som, em Fortaleza.

Turma do Circuito

Um dos momentos mais marcantes foi quando integrou a Turma do Circuito, juntamente com os DJ´s Camelo, Simpson e Cambota. Mas foi na equipe Agito Jovem onde passou mais tempo, juntamente com seu inseparável amigo DJ Júnior On The Best, com o apoio dos proprietários Sávio Aguiar, do gerente Bebeto. Na época, surgiu o convite para atuar como DJ do programa Ênio Carlos, na época na TV Manchete, hoje na TV Diário.

Além do rádio, da televisão e das festas DJ Jacaré também se especializou em sonoplastia. Passou a produzir comerciais e vinhetas. No início da década passada, em 2000, foi convidado para aprontar o material sonoro da campanha de um político, Ilário Marques, ex-prefeito de Quixadá, atualmente deputado federal. Naquela época, os showmícios eram permitidos e quem tinha mais criatividade agradava os eleitores.

O trabalho dele fez sucesso e acabou sendo convencido a ficar em Quixadá. Surgia um novo desafio profissional e a oportunidade de difundir o funk, seu ritmo preferido, numa região do Interior do Ceará. O reconhecimento teria chegado mais cedo se o funk não fosse marginalizado até o fim da década passada.

A violência passou a predominar onde os bailes eram realizados, na periferia da cidade. Não era diferente de Fortaleza e até mesmo do Rio de Janeiro, onde o funk nacional surgiu. O estilo ressurgiu nos últimos anos com uma nova roupagem. Os dancings se tornaram mais suaves. Os mestres de cerimônia das festas, mais conhecidos como MC´s, também passaram a agitar os encontros com melodias leves.

Na Web

A internet também está ajudando. Uma produção musical do filho Eduardo Silva, o Edu, 20 anos, alcançou mais de 380 mil acessos no Youtube com o funk "Nossa Alegria". Além de Edu, o filho mais novo, Erick Veras, também utiliza a web para divulgar suas produções e seus shows. Ambos resolveram seguir os passos do pai. Com a limitação e até a manipulação nas emissoras de rádio e televisão, na maioria das vezes centradas nos interesses próprios, a rede mundial de computadores passou a funcionar como o principal meio de divulgação do funk. "Caiu no gosto popular e os grandes empresários se interessam", explica DJ Jacaré.

Ele e os filhos encontram na realização dos bailes funk uma boa fonte econômica. Nos fins de semana, colocam suas baterias eletrônicas debaixo do braço e saem para as festas. Boa parte delas são aniversários, casamentos e eventos sociais. O valor de cada apresentação varia de R$ 500 a R$ 1 mil.

Em média são de três a quatro horas de diversão. Nas boates da região, os ingressos custam de R$ 5 a R$ 20. Mesmo com as festas de forró, a cada fim de semana, o público funkeiro cresce. A restrição dos pancadões, com paredões de som, permitidos somente em ambientes fechados, com tratamento acústico, também ajuda. Essas transformações estão abrindo espaço para mais profissionais de Quixadá, como os DJs Wesley, Marquinhos, Marlon, Willams e Gean. Todos estão se destacando nas pistas de dança, em cidades do Ceará e até de outros estados.

FIQUE POR DENTRO

Estilo foi se reinventando através dos anos

O funk é um gênero musical com origem na 2ª metade da década de 60 quando músicos afro-americanos, misturando soul, jazz e R&B, criaram uma nova forma de música rítmica e dançante. Pode ser melhor reconhecido por seu ritmo de batidas repetitivas sincopado, pelos vocais de alguns de seus cantores e grupos e ainda pela forte e rítmica seção de metais, pela percussão marcante e ritmo dançante. Passou a ser considerado um gênero distinto a partir de inovações de James Brown em meados dos anos 60. No Brasil, os bailes funks do Rio começaram a ser influenciados por um novo ritmo da Flórida, o Miami Bass, que trazia músicas mais erotizadas e batidas mais rápidas. As primeiras gravações de funk carioca eram versões. A maior parte das rádios dedicavam grande espaço para os sucessos feitos no ritmo funk, um dos mais famosos é a regravação de uma canção de Raul Seixas: o "Rock das Aranhas". O funk conseguiu mascarar seu ritmo, mostrando-se mais parecido com um rap americano e integrando-se mais às demais classes sociais cariocas. Sua batida repetitiva, o pancadão, é inspirada no Miami Bass e rap americano.

Mais informações
DJ Jacaré Produções
Travessa Estudante Antonio Brito, 804, Quixadá
Telefone: (88) 9981.3345
email: jsgrava@hotmail.com 

Unidos para defender o estilo
Casas de shows no Interior do Estado ficam lotadas nas noites de fim de semana. Elas estão abrindo espaço para esse tipo de música, que se reformulou e vem agradando ao público interessado em opções de lazer diferentes nas baladas

Fundada há pouco mais de ano, em Fortaleza, a Associação Cearense dos Artistas do Funk (Acaf) está expandindo pelo Interior do Estado seus horizontes musicais e sociais. Conforme o presidente da Associação, Gutemberg Magalhães, atualmente 44 MC´s e 28 DJ´s, todos profissionais, a maioria da capital, estão associados.

A Acaf conta com alguns associados no Sertão Central, no Maciço de Baturité, na Zona Norte e no Cariri, mas, mesmo assim, ainda são poucos. Por esse motivo, neste ano, haverá a interiorização do movimento de fortalecimento da classe.

Ao mesmo tempo, a entidade pretende implantar oficinas de formação de músicos e produtores no Interior. O projeto deve começar pelas cidades de Santa Quitéria e Guaraciaba do Norte, explicou o presidente.

Sem vulgarização

A respeito do funk em Quixadá e no Interior do Ceará, Magalhães acredita na expansão do estilo, principalmente nas casas de shows, com apresentações cada vez mais bem produzidas e participação de MC´s. As mudanças mais recentes, mais para o estilo melody, sem apelos, nem vulgarização, tornou os bailes mais sociáveis. Quem vai às festas, procura se vestir melhor. Bem diferente do período sombrio enfrentado há alguns anos com a marginalização do funk. Ele concorda com a proibição dos paredões de som nas ruas.

O combate à poluição sonora está abrindo mais espaço nas casas de show. Algumas delas estão começando a lotar. Dessa vez com mais sensualidade e beleza, sem apelações, ressalta.

Com mais de 20 anos dedicados ao funk, Magalhães reconhece o período ruim enfrentado pelo funk cearense na última década, provocado pelas torcidas organizadas. Travavam verdadeiras guerras nos salões, prejudicando a imagem dos músicos profissionais, tanto os discotecários, mais conhecidos como DJ´s e os cantores, conhecidos como MC´s, cuja abreviatura se refere a mestres de cerimônia, das festas. Uma nova postura foi adotada, proibindo a entrada das torcidas, mas o funk continuou sendo discriminado no Ceará.

Movimento associado

Sobre a Associação, Gutemberg Magalhães explicou ter sido criada a partir de um novo ataque da mídia, dessa vez falso. Segundo ele, um programa de TV cearense exibiu imagens de dez festas, com mulheres nuas, atribuindo as baladas realizadas em Fortaleza. "Com reportagem apelativa e enganosa prejudicou os profissionais do funk", explica, ressaltando que a categoria se reuniu para exigir direito de resposta.

A realidade das festas funk realizadas em Fortaleza é bem diferente. A cada dia as casas de show estão abrindo mais espaço para o funk cearense. Mesmo assim, por conta do incidente, resolveram fundar a Acaf.

Na opinião de um dos associados mais respeitados pela categoria, Ricardo Santos de Sousa, o DJ K-Dinho, como é conhecido artisticamente, apesar do forró estar no sangue nordestino o funk também se identificou com o cearense.

O associativismo está abrindo novas fronteiras. Bem diferente dos períodos sombrios, hoje alguns músicos estão ganhando destaque nas grandes mídias. É o caso do Koringa, com direito a participar da trilha sonora da novela Salve Jorge, da Rede Globo.

Ele também já conseguiu destaque na emissora, no Globo Esporte, quando produziu o funk da "Carroça Desembestada", alusivo ao time do Ceará. Agora é a vez do amigo DJ Jacaré levar o funk da terra para o exterior. "Ele será o nosso porta-voz", completou.

Mais informações

Associação Cearense dos Artistas do Funk (Acaf). Rua 4 de outubro, 199, Henrique Jorge, Fortaleza.
Telefone: (85) 8611.8968 

ALEX PIMENTELCOLABORADOR 

FONTE: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1254509