sexta-feira, 27 de maio de 2011

SERTÃO CENTRAL

Voluntário leva esporte na luta contra drogas.

A maior paixão brasileira, o futebol, está livrando crianças e adolescentes do consumo de drogas.

Quixadá. Ainda não há registro oficial, no Ceará, da nova droga da morte, o oxi. Porém especula-se a circulação da droga no Estado, diante da semelhança com o crack. Apreensões começaram a ocorrer em Fortaleza, no início deste mês. A Polícia aguarda resultado de exame para confirmar oficialmente. Para prevenir a entrada desta e de outras drogas no interior do Estado, um jovem resolveu se antecipar em defesa de crianças e adolescentes de sua cidade. Contando apenas com o apoio de alguns voluntários e de empresários, o fotógrafo Renato Fidelys está lançando, em Quixadá, o projeto "Crack Só no Esporte". Dezenas de meninos estão sendo assistidos. Participam de atividades esportivas e recebem orientações preventivas.

O jovem de apenas 24 anos teve a ideia quando viu o número de viciados aumentando no seu bairro, o Campo Novo, o mais populoso e um dos mais problemáticos da cidade. Era comum se deparar com adolescentes, e até crianças, consumindo crack nas esquinas, inclusive em plena luz do dia. A Polícia começou a combater os traficantes. Muitos foram presos. Um deles usava uma casa na rua mais movimentada do bairro para comandar a distribuição de drogas. Preocupado, Fidelys resolveu agir. Entreter a meninada com a maior paixão brasileira, o futebol. Logo surgiram mais de 40 "viciados" no esporte.

Conselhos de mãe

Vitor Hugo Oliveira, 13 anos, é um dos mais empolgados do grupo. Perdeu as contas das vezes que outros amigos o convidaram para queimar crack com eles. Sempre atendeu aos conselhos da mãe. Experimentar qualquer coisa capaz de lhe fazer mal, principalmente de viciar, nunca. Ele já viu colegas da rua indo para o campinho próximo. "Lá, só joga quem fuma crack", ouviu falar. "Com a oportunidade de jogarem em um gramado, no melhor local da cidade, muitos, com certeza, vão preferir entrar no time do Fidelys", comenta sorridente.

A iniciativa também atraiu o interesse de muitos pais. Alguns deles não sabiam o que fazer. Manter os filhos presos dentro de casa por toda a juventude, impossível. Deixar irem para rua, para os campinhos de pelada, um risco muito grande. Sem o acompanhamento de adultos responsáveis, nem pensar. Assim pensa a costureira Lindete Barbosa de Oliveira. Dinheiro para pagar uma escolinha de futebol, não tem. O filho de nove anos chorava para jogar, mas onde? A brincadeira no Pinheiro Society, nas quartas e sábados, chegou em boa hora. "Agora tem diversão saudável", comenta aliviada.

Mais do que aliviado ficou o avicultor José Célio da Silva. A empolgação com a novidade foi tamanha que resolveu ser voluntário. É ele quem reúne o grupo e escolhe os times. Antes da partida, o sermão: "Droga aqui não entra! É cartão vermelho pra ela e pro jogador antes do pontapé inicial!".

Segundo Fidelys, dependendo do apoio de quem está apostando na sua proposta as garotas também poderão participar.

Atualmente, 46 jovens são assistidos pelo projeto independente. São garotos dos 10 aos 16 anos. Alguns são craques de bola. Outros, nem tanto. Todavia o coordenador e seu auxiliar garantem que mesmo quem não tem jeito com a redondinha tem lugar garantido no time, e não adianta o resto da equipe reclamar. A participação de todos é importante. Talvez esse seja o motivo de mais de 60 meninos estarem na fila. A ideia de Fidelys é atender, pelo menos, 100 crianças e adolescentes de ambos os sexos. Mas faltam recursos para a ampliação.

Além do Pinheiro Society, cedendo o espaço para os jogos, ele recebe o apoio do apresentador do Comando 22, da TV Diário, Ferreira Aragão. A emissora comunitária do bairro onde reside, a Digital FM, e o Instituto de Pesquisa Viola Poesia e Cultura, promotor do Encontro dos Profetas da Chuva, são outros parceiros. O projeto será lançado oficialmente no início de junho. A data ainda não foi definida.

MAIS INFORMAÇÕES
Projeto Crack Só no Esporte
realizado com jovens no Município de Quixadá - (88) 9639.4026
renatofidelis_@hotmail.com
FAÇA SUA CONTRIBUIÇÃO

PARTICIPAÇÃO

Prevenção é realizada por etapas de atividades

Quixadá Não é de hoje que são feitas referências à pedra da morte nas ações de combate às drogas. No início de 2009, a Coordenadoria da Juventude de Quixadá, uma das vertentes da Secretaria de Esportes deste Município, iniciou trabalho assistencial para menores de idade, o "Craques X Crack".

Segundo o articulador do projeto, Carlos Clayton Silva, as atividades preventivas estão sendo realizadas por etapas. Naquele ano foi desenvolvida a sensibilização. No ano seguinte, atividades esportivas. Neste ano, será realizada a fase cultural das atividades.

Rede pública

A proposta, idealizada pela organização não governamental MH2O, contempla alunos de toda a rede pública. Primeiro, um psicólogo orientou sobre os perigos das drogas. Um advogado ressaltou as implicações legais e um educador físico levou orientações sobre a importância da prática de atividades saudáveis. Em seguida, foi realizado um torneio de futebol de rua e shows de hip-hop. Agora estão sendo preparados festivais de danças de rua e de teatro. O objetivo é atender, pelo menos, 15 mil adolescentes.

Em Quixadá, a Comunidade Novos Horizontes acolhe dependentes químicos. O Centro de Atenção Psicossocial (Caps) presta assistência a quem pretende se livrar das drogas e a Associação Cultural Artística e Ecológica do Ceará (Acaec) está formando um grupo de Narcóticos Anônimos. A cidade já conta com os Alcoólicos Anônimos (AA). São 104 em todo o Estado. No Sertão Central existem também grupos de AA em Boa Viagem, Canindé, Choró, Madalena, Mombaça, Pedra Branca, Quixeramobim e Senador Pompeu. Os Centros de Referência e Assistência Social (Cras) e o Proerd, da Polícia Militar, também estão na luta.

Alex Pimentel
Colaborador

Mistura letal na droga

O oxi é uma mistura de pasta-base de cocaína refinada, cal virgem, querosene ou gasolina e ácido sulfúrico com água de baterias automotivas. Nele, ainda, é possível encontrar a presença de acetona, amônia, soda caustica, amônia e até cimento. Seu consumo é igual ao do crack. Por esse motivo, e pelo baixo custo, está se popularizando rapidamente. Cada pedra tem o valor médio de R$ 2,00. O crack já está sendo vendido a R$ 5,00. O preço pode chegar até R$ 15,00. Outros fatores para que a droga se espalhe rapidamente é a facilidade de produção e o seu potencial alucinógeno. Assim como o crack, o oxi provoca rapidamente o dobro de alucinação comparando-se com a cocaína e pode ser produzido em qualquer lugar sem que haja necessidade de técnica apurada e equipamento sofisticado. As pedras de oxi podem ser mais amareladas ou mais brancas, dependendo da quantidade de querosene ou cal. Ainda não há pesquisas científicas sobre os danos provocados à saúde. Sabe-se apenas que, por causa da composição, formada por elementos químicos agressivos, afeta o organismo mais rapidamente, como, por exemplo, o aumento da pressão arterial, alto risco de infarto e acidente vascular cerebral (AVC). A única pesquisa conhecida sobre a droga foi feita, em 2005, pelo vice-presidente da Associação Brasileira de Redução de Danos (Aborda), Álvaro Augusto Andrade Mendes. Ele acompanhou 100 pacientes que fumavam oxi. Chegou a uma terrível constatação: a droga matou um terço dos usuários no prazo de um ano. Além do alto risco de morte no médio prazo, seu uso contínuo provoca reações intensas. São comuns vômito e diarreia, aparecimento de lesões precoces no sistema nervoso central e degeneração das funções hepáticas. Solventes na composição da droga podem aumentar seu potencial cancerígeno. A primeira apreensão dessa droga foi constatada no Acre, na década de 80. Recentemente se estendeu para outros Estados da Federação.

MARCOS SANDRO NAZARÉ DE LIRA*
Delegado da Polícia Civil


FONTE: DIÁRIO DO NORDESTE
FOTO: ALEX PIMENTEL

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